quinta-feira, 15 de junho de 2006

Mãe

Sou filha de um operário e de uma costureira. Como todo operário brasileiro, meu pai sempre trabalhou muito. Cresci sem quase vê-lo. Minha mãe trabalhava em casa, fazendo costuras para fábricas. Estudou pouco, mas entendendo minha sede de aprender, me comprou vários cadernos pois não podia pagar escolinha. Eu escrevia uns rabiscos e ia lá perguntar se tava escrito alguma coisa. Ela me arranjava uns livros, uns papéis, lápis ..... e eu lá, firme no meu propósito de aprender a ler e escrever . Dizem que eu aprendi sozinha aos 4 anos, mas sem a minha mãe isso não seria possível. É quase um segredo nosso. Sabe fazer os cálculos básicos, mas vendo minha inquietude, sentava comigo e me ensinava a contar até 10, depois até 20, 30, com grãos de feijão enquanto os separava para cozinhar depois. São essas as maiores e melhores lembranças da minha infância até os 7 anos quando finalmente pude entrar para a escola pública. Escola particular, nem pensar. Pois entrei já sabendo mais que todo mundo da sala, graças à ela que soube me entender e repartir o pouco que sabia comigo. Ficávamos sozinhas em casa, ela costurando, parando para cozinhar e cuidar da casa e eu por perto sempre com um caderno e um lápis, perguntando tudo. Comprava um brinquedo no início do ano e com economias, ia pagando um pouquinho cada mês. No fim do ano, lá vinha um presente novinho pra mim e pro meu irmão. Não teve infância, mas talvez por isso mesmo, sabia como ninguém o que era importante para uma criança. E por isso havia sempre uma procissão de sobrinhos em volta.
Minha mãe tá indo embora.
O que eu mais queria no mundo era poder ficar agora com ela. Todos os dias. Conversando como fazíamos no inicio, agora que tem um quê de final por perto. Agora ela precisa de alguém pra ir ao banheiro, pra tomar banho, pra se vestir. Coisas que sempre fez por mim e que quase não posso fazer por ela agora. Os papéis se invertem e é injusto que essa inversão não possa acontecer por completo.
Ela tá indo embora.
E eu não sei pra onde vou.

segunda-feira, 12 de junho de 2006

Por que não pensar?

Ouvindo algumas conversas, lendo jornais (sobretudo as cartas dos leitores), vendo TV, fico preocupada com algumas coisas que vejo e ouço, tipo:Natal - tem que comprar presentesMenina - usa rosaMenino - usa azulMe sinto numa sociedade de autômatos . Estamos reagindo automaticamente a algumas situações que servem de estímulo. Não estamos pensando mais. Uma geração de analfabetos funcionais está ficando adulta. Crianças e jovens que não sabem interpretar um texto, que dirá um contexto....E no meio disto tudo, a vida vale cada vez menos. Engravidou? Foi descuido? Tira!Pegaram o bandido que matou uma pessoa? Lincha! Não há mais tempo para o exercício do pensar. Reage-se e vai-se vivendo. Pensar dá trabalho. Analisar uma situação sob diversos ângulos, toma tempo.E assim pra onde estamos indo?